quinta-feira, 31 de agosto de 2006

Operação Resgate

"Welcome to Fright Night... for real!"





Finalzinho dos anos 80. Eu ainda não era sócio daquele clube de sorridentes proprietários de um lindo VCR com sistema VHS de reprodução. E só freqüentava cinema (muito) ocasionalmente. A principal vitrine hollywoodiana que eu tinha era mesmo o pacote de filmes da Rede Muito Além do Cidadão Kane de Televisão. Pra ser mais exato, na então recém-inaugurada Tela Quente, com um delay médio de três anos em relação às estréias na telona. O fato é que o programa, em seus primeiros tempos, era top de linha no segmento. A gigante do Jardim Botânico finalmente estendia seu braço de modernização social para área do entretenimento cinematográfico. Não tinha pra ninguém. Antes disso, tínhamos que nos contentar com relíquias de um passado muito distante. Obviamente, longe ser bondade da emissora, a estratégia era brecar a escalada fulminante de um ex-funcionário rechonchudo.

Bem, eu não tava nem aí. O que eu queria mesmo era que março chegasse logo pra poder conferir todas aquelas maravilhas, cujas propagandas me serviam como analgésico durante o maldito mês do Carnaval. Foi ali que vi pela primeira vez alguns filmaços que não consegui assistir no cinema, por razões diver$as. Belezinhas pop como De Volta Para o Futuro, Os Caçadores da Arca Perdida, Uma Noite Alucinante, Aliens: O Resgate, Predador, Máquina Mortífera, Os Caça-Fantasmas, Curtindo a Vida Adoidado, Aventureiros do Bairro Proibido e toma pipoca com guaraná (Baré, por obséquio).

Foi numa daquelas segundas-feiras movidas a descobertas acachapantes que assisti, petrificado, A Hora do Espanto (Fright Night, 1985). Escrito e dirigido por Tom Holland, o filme reinventou os thrillers de vampiros e os introduziu na Era Moderna. Literalmente. Salvas raras exceções, os exemplares do gênero eram, invariavelmente, produções de época. Tenha em mente um cenário do século XVIII, com o venerável Christopher Lee vestido à caratér e com olhos injetados de sangue. Do alto de seu castelo gótico, ele observa friamente um vilarejo de camponeses supersticiosos. Era mais ou menos por aí.

A exemplo do que John Carpenter fez em Halloween, Tom Holland transportou o horror para uma realidade mais próxima. Sem mais aquela de principados no leste europeu ou de castelos assustadores no meio do nada. Os monstros agora passeavam pelos subúrbios e se esgueiravam pelos quintais...


Os personagens e seu microuniverso seguiam o mesmo conceito de normalidade contemporânea despachada e corriqueira. Tipo a minha vida ou a sua (se você não for parente de dotô). Filho de pais divorciados, o adolescente Charley Brewster (William Ragsdale), namora com a delícia cremosa Amy Peterson (Amanda Bearse), é amigo do histriônico "Evil Ed" Thompson (Stephen Geoffreys), vive com a mãe balzaca e não é nenhum prodígio na escola. Não que fosse um loser também... estava mais pro meio-termo, o que já caracterizava uma abordagem diferente do que o cinema vendia até então. Ou você era um nerd de fazer inveja ao Eddie Deezen ou era o líder do time de fightbol americano. Graças à Bram Stoker, estereótipos pés-no-saco não deram as caras no filme. Sábia decisão.

Numa noite de amassos estilo ação=repulsão com Amy, Charley observa seus novos vizinhos, Billy Cole (Jonathan Stark) e Jerry Dandrige (Chris Sarandon), carregando um móvel meio suspeito pra dentro de casa. Chegado em trasheira B e, em especial, num horror show de TV chamado Fright Night (um Cine Trash gringo), Charley até comenta com Amy o estranho fato, mas o máximo que consegue é perder uma boa trepada. No dia seguinte, ao chegar da escola, Charley é abordado por uma vistosa "terapeuta de relaxamento corporal", que lhe pergunta onde fica a casa de Dandrige.

Uma das melhores sacadas do filme é que, apesar de ter envelhecido em certos aspectos, ele jamais perde seu charme e confirma que certas coisas nunca mudam...


Me senti como se estivesse assistindo pela 1ª vez de novo. Glória à Deus.

O tempo fecha quando Charley vê a foto da moça no noticiário, engrossando uma lista de assassinatos em série que assola a região. Pra completar, na noite seguinte, o rapaz flagra uma ceninha interessante rolando na janela ao lado.


Ceninha esta com um baita anti-clímax medindo três polegadas em cada canino. Cumprindo seu dever de cidadão honesto, Charley avisa todo mundo sobre a ligação dos assassinatos ao vampiro que mora ao lado. Esforçado, chega até a arrastar um desconfiado policial para sondar a residência, em vão - o que lhe rende uma visitinha do nosferatu em pessoa. Com os dias (ou as noites) contados, Charley, desesperado, recorre ao apresentador do Fright Night, o destemido caçador de vampiros Peter Vincent (Roddy McDowall). Desse momento em diante, o filme, que já estava bacana, se torna surpreendente e indispensável.


O Peter Vincent do saudoso Roddy McDowall é, seguramente, um dos personagens mais carismáticos do Cinema. Sem sacanagem. Fora a homenagem a dois ícones da tosqueira B (Peter Cushing & Vincent Price), o "corajoso" vampire-hunter é o responsável pelos momentos mais engraçados de A Hora do Espanto. Principalmente durante as cenas de seus filmes - um festival de erros de continuidade e canastrice. Não satisfeito, McDowall, além do humor irresistível, ainda dá um banho de dramaticidade, como na cena em que observa, emocionado, a morte de um dos personagens, com o ator em questão sob toneladas de maquiagem e látex. Se considerarmos o passado cênico do ator inglês, sua escolha de atuação fica muito mais tocante. Afinal, quem melhor que ele para enxergar o homem atrás da máscara? Memorável.

O carismático Chris Sarandon no papel de Jerry Dandrige foi um golaço em Rogério Ceni com direito à nove chapéus a partir do meio-de-campo e finalização de bicicleta. Seu inegável sex-appeal, o ar cruel/blasé e o fato de adquirir uma forma grotesca quando ficava puto, fizeram de Dandrige o primeiro de sua geração. Antes dele, só haviam sanguessugas aristocratas from Romênia & Moldávia. A moda ganhou força dois anos depois, com o ótimo Garotos Perdidos (The Lost Boys). Hoje, qualquer Buffy ou Blade (e seus zilhares de genéricos) trazem vampiros monstruosos, góticos/headbangers/punks e sintonizados com as novas tendências fashion. A fórmula foi overdosada até a morte. Porém, o status de inovador sem precedentes é de A Hora do Espanto e ninguém tasca.



Ok, ok, calma lá... Fome de Viver (The Hunger) é de 1983 e teve a manha de enfiar 10 minutos de um show do Bauhaus logo no começo, escalou o Ziggy Stardust David Bowie e colocou a toda-supimpa Catherine Deneuve no papel de uma vampira gothique-nouveau, além de introduzir (opa!) o lesbian chic na cultura pop contemporânea.


...mas A Hora do Espanto era pra moleque da minha idade, pô.


Falando nisso, um assunto que rendeu muita especulação em torno do filme é a natureza da relação entre Dandrige e o psicopata undead Billy Cole. Há quem diga que existia aí uma parceria amigável no nível de Maverick & Goose, as gazelas voadoras de Top Gun. Pois digo-te não, vil criatura! Dandrige era o Mestre, o Lorde das Trevas, e Billy era tão somente o serviçal, o slave, o submiss... hã, esquece. Mas voltando... outro detalhe interessante era que, apesar da carenagem novinha, as características sobrenaturais de Dandrige seguiam o básico tradicional estabelecido pelo Drácula e imortalizada pelo Conde Orlock (de Nosferatu, 19... 22). Sendo assim, ele podia se transformar em morcego, lobo e névoa, além de possuir poderes hipnóticos e ter todas as fraquezas do manual clássico - incluindo intolerância à certos "penduricalhos". Sinceramente, um dos melhores vampiros do cinema.

Os efeitos especiais são surpreendentes, ainda hoje (se considerarmos que pertencem a um passado praticamente artesanal na área). Muitos cabos, bonecos, animatronics, jogos de sombra e luz, sobreposições, trucagens óticas e outras técnicas old school - fora o trampo soberbo da equipe de maquiagem. Seqüências como a impressionante "destransformação" de Evil Ed são de desprender o queixo e fazer embaixadinha com ele antes de tocar o chão...


Fosse feito em CG, perderia 90% do impacto.

Outro grande momento envolve Amy. Quando ela é vampirizada, abandona a imagem de menina superpoderosa e vira um mulherão com feromônio espirrando pelos poros. Mas durante a seqüência em que ataca Charley, seu rosto se desfigura em uma carranca horripilante. Até hoje, não entendo direito o que fizeram com a garota. Certamente, a mandíbula gigantesca era uma prótese, mas fazer a movimentação perfeita do trambolho deve ter exigido um esforço dracúleo.


A Hora do Espanto fez bastante sucesso na época. Arrecadou cerca de 25 milhões de doletas, sendo que os custos de produção foram de 9½mi. Pois é... parece que foi em outro século. E foi mesmo. Com a boa repercussão de público e crítica, a inevitável seqüência veio em 1988 (bem interessante, aliás - assunto pra próxima), reaproveitando apenas Ragsdale e McDowall do cast original. Fora a continuação do filme, Ragsdale não figurou em mais nenhuma produção de ponta. Dedicou-se quase exclusivamente às telesséries, com destaque para sua participação no estourado sitcom Ellen, em meados dos anos 90. Lá, ele fazia o namorado da personagem-título (interpretada pela Ellen DeGeneres), antes da mesma assumir sua sapatãozice lesbianicitude.

Stephen "Evil Ed" Geoffreys já era uma cara conhecida dos brazucas. Naquele mesmo ano, ele e Amanda "Amy" Bearse participaram da comédia de verão Férias da Pesada/Quando a Turma Sai de Férias (Fraternity Vacation), bobagem típica dos anos 80 que foi reprisada pelo SBT até a fita se desmagnetizar. De bom, tinham as centenas de loiras absurdas de biquíni e um Tim Robbins no útero da carreira. "Mas a vida é uma caixinha de surpresas", e Geoffreys (que chegou a ser indicado a um Tony Award, em 1984, por uma performance na Broadway) deu uma guinada sinistra na carreira. No início dos anos 90, ele começou a figurar em filmes pornô voltados para o público gay, geralmente creditado como 'Stephan Bordeaux' ou 'Sam Ritter'. E fazia sempre a parte mais, como direi, "filantrópica" da relação. Já a gracinha Amanda Bearse também trilhou um caminho paralelo ao cinemão hollywoodiano, estrelando basicamente filmes para TV e telesséries - notadamente, o bacanudo Married... With Children, no qual, além de atuar, também escreveu e dirigiu vários episódios.

Ah, Bearse é lésbica assumida (que coisa) e é considerada uma das maiores defensoras da causa. Chegou a apresentar um especial para TV chamado Out There², um stand-up só com comediantes homo-lesbo-transkçwfajxuais.

Chris Sarandon voltaria a trabalhar com o diretor Holland dois anos depois, em Brinquedo Assassino (Child's Play). Depois disso, embarcou em produções discretas, sem muito alarde. Também fez muita televisão e participou de algumas séries de sucesso, como Felicity, Charmed, Lei & Ordem e Chicago Hope. Em tempo... no excelente O Estranho Mundo de Jack (The Nightmare Before Christmas, 1993), Sarandon fazia a voz do protagonista. Jonathan Stark também manteve uma trajetória fora dos holofotes, trabalhando como ator, roteirista, produtor e até consultor criativo. Roteirizou alguns episódios de Cheers, aquele sitcom com o Ted Danson.

Apesar da extensa filmografia de Roddy McDowall, vergonhosamente, só conferi seus trabalhos mais famosos. O inesquecível Cornelius, do clássico Planeta dos Macacos (incluindo as continuações e a série de TV), O Destino do Poseidon, a sessão da tarde Um Salto para a Felicidade, entre outros. E não poderia deixar de mencionar que ele dublou o Chapeleiro Louco, nos episódios de Batman: The Animated Series (mas este chegou aos meus ouvidos em "versão brasileira... Herbert Richers"). Roddy tinha 70 anos quando partiu, em 3 de outubro de 1998.

Sempre achei que o diretor Tom Holland deslancharia para uma bela carreira cinematográfica. Poucas vezes, um cineasta conciliou tão bem elementos díspares de gêneros como terror, aventura e comédia teen, sem que a mistura se tornasse intragável. A impressão ficou mais forte com o inesperado sucesso de Brinquedo Assassino, mas parou por aí mesmo. Holland se dedicou a fazer filmes para TV, e até esbarrou no suspense/terror algumas vezes: dirigiu alguns episódios de Contos da Cripta, e os filmes Fenda no Tempo e A Maldição - duas adaptações matadinhas de Stephen King.


No início dos anos 90, a obscura editora NOW Comics fez uma quadrinhização do filme, aproveitando o lançamento da continuação nos cinemas. Acabou emendando a HQ em uma publicação mensal, que durou apenas algumas edições. Confesso que até fiquei curioso em saber o que andaram arrumando com os personagens, mas o interesse durou até eu ver as capas. Bregas e toscas ao extremo, uma delas (um especial de Halloween) trazia de brinde um óculos 3-D "da hora" (na época, um recurso hypeadíssimo via A Hora do Pesadelo 6 - O Pesadelo Final). Diante deste quadro, nem me dei ao trabalho de caçar as revistas.

A NOW Comics encerrou suas atividades em fevereiro último, após mudar de nome duas vezes. Até que durou bastante.


A trilha sonora de A Hora do Espanto também é digna de nota. Reunia algumas das bagaceiras mais divertidas dos anos 80. Tinha J. Geils Band (nome da música: Fright Night), os farofeiros do Autograph, o new wave tardio do April Wine, o pop-yuppie do White Sister e de Evelyn King, e até as presenças ilustres do Devo (com Let's Talk) e do Ian Hunter (ex-Mott The Hoople).

Já a trilha incidental era um primor à parte - méritos do compositor Brad Fiedel, o responsável pelas trilhas de True Lies, Blink e, wow, dos 2 primeiros filmes da franquia Exterminador do Futuro. Claro, aqui não tem nada tão marcante quanto os clássicos acordes minimalistas/industriais do Terminator, mas ainda assim é belíssima. Ou melhor, assustadora (no bom sentido) e bem soturna. Destaque para a hipnotizante Come To Me, tanto na versão com vocais como na instrumental. Perfeita pra morder uns pescocinhos por aí.

Na trilha: 1.032 canções com o Winamp em modo shuffle. Tem de Slayer até Vicente Celestino.

domingo, 20 de agosto de 2006

A OUTRA HISTÓRIA AMERICANA



"(...) as pessoas vão buscar certas referências ocultas. Mas não é necessário um profundo conhecimento sobre essas coisas. Precisa saber que, quando ele fala, você diz: 'parece que ele sabe do que está falando'. Por isso, incluí aquilo no gibi...
para parecer que sei do que estou falando."

Este é Mike Mignola, explicando um pouco de seu processo criativo, durante uma coletiva na Comic-Con de 2002. Apesar do comentário se referir ao universo de sua cria mais famosa, também decifra muito da mística de suas obras em geral e da maneira sempre insólita com que ele (re)vê certos padrões, por mais que estes tenham sido explorados ad nauseum. Jogar com a sugestionabilidade alheia é uma arte sutil. Dependendo da imaginação do observador, a coisa pode ir muito mais além do que o próprio autor conseguiria. Basta fornecer um ou dois pequenos trechos de informação e o céu é o limite. O único porém é saber quais informações e em qual contexto. Mignola e o diretor Guillermo del Toro falam sobre isto (entre outras coisas) no sensacional DVD de extras do filme Hellboy, que, por sinal, merece uma boa destrinchada qualquer hora dessas.

No caso do demônio de chifres serrados, as referências ao ocultismo e ao folclore de várias culturas pipocam em ritmo estroboscópico. Não que sejam meros factóides azeitados à moda da casa, longe disso. Termos como Selo de Salomão, Lamia, Mitologia Cthulhu, Dama Sangüinária do Cachtice, Iggdrasil, e obscuridadezinhas Lovecraftianas afins, têm seu lugar garantido como "objetos de estudo".

Neste sentido, é bem interessante o comentário de Mignola. Ao espalhar este lote de referências nos quadrinhos, elas acabam adquirindo traços do mesmo idioma pop em que foram inseridas. Nada melhor para instigar uma daquelas sessões de pesquisa que atravessam a madrugada movidas à cafeína.


É verdade que tal abordagem não é mérito exclusivo de Mignola. Mas até onde vejo, ele é o Tiger Woods do Oculto. Grande parte desta impressão vem da naturalidade e espontaneidade gritantes de seu texto. E, claro, daquele traço. É fácil perceber que o cara se divertiu horrores enquanto trabalhava nas histórias. The Amazing Screw-On Head eleva esta característica à zilionésima potência. É hilário. Mignola já fez graça antes, como na ótima mini do sumido Rocket Raccoon e na adaptação do conto sword & sorcery Fafhrd And The Gray Mouser. Mesmo em Hellboy, ele sempre teve utilizou ganchos cômicos nos argumentos, mas nunca desta forma. Mignola revela ser dono de um timing absurdo pra comédia. Encarna uma Alice Liddell gótica e passeia pelo maravilhoso mundo do humor negro. Com uma simplicidade quase singela, ele abraça o bizarro com a mesma familiaridade de Tim Burton dirigindo Johnny Depp.

O resultado faz de TASOH, além de um puta exercício de estilo, escapismo em estado bruto. Este texto aqui soa mais pesado que o desenho.

O episódio piloto foi exibido pelo Sci-Fi Channel, no início do mês. Curiosamente, a animação foi adaptada de uma HQ one-shot, escrita e desenhada por Mignola em 2002, para a Dark Horse. Em quadrinhês, "one-shot" é o equivalente a um episódio piloto. Infelizmente, a revista ficou só nisto, o que indica que os próximos capítulos da série poderão ser criações exclusivas e inéditas do autor. E vou te contar uma coisa. Não vejo uma releitura tão agregada ao material de origem desde o cânhamo animado The Maxx, do genial Sam Kieth. Não é pra menos, pois Mike Mignola comparece nos créditos como diretor de arte. Então, nada mais natural que os profissionais envolvidos fossem submetidos à um cursinho de "Jack Kirby encontra o Expressionismo Alemão", como bem classificou Alan Moore.

Quem curte o traço peculiar do cara, vai querer gravar em DivX e exibir o desenho num telão em praça pública.


Screw-On Head é um agente top-secret do governo norte-americano na época da Guerra Civil. Basicamente, é uma cabeça mecânica parafusável. Com a dedicação de um Jack Bauer, ele é uma espécie de "última linha de defesa" da administração Lincoln (sim... o bom e velho Abraham) contra as inúmeras intempéries do Mal que ameaçam os cidadãos americanos. Em especial, aquelas provocadas pelo tétrico Imperador Zombie (hehe) e seus temíveis lacaios: duas velhinhas e um macaco (na revista, eram três velhinhas - a "criminosa lunática" ficou de fora). O vilanesco Zombie invade o Museu de Livros e Documentos Perigosos, seqüestra o Professor Fruen e rouba um artefato conhecido como "Fragmento Kalakistão". Segundo a lenda, o tal fragmento, se traduzido, indica o local onde está escondida a "Fabulosa Jóia do Tamanho de um Melão". Este nabo, digo jóia, foi a fonte do poder sobrenatural de Gung, O Magnífico, um tirano que dominou o mundo em 9.632 a.C. Para cumprir sua missão, nosso herói contará com o valioso auxílio do Sr. Groin e de seu fiel cachorro... o Sr. Dog.

Muito pouco é revelado sobre o passado do parafuso ambulante. A única seqüência mais reveladora rende um ótimo momento, quando o mesmo troca juras de amor com seu antigo interesse romântico. Na HQ, Mignola chega a brincar ironicamente com a questão da origem ultra-secreta do herói (provavelmente, porque ele nem se deu ao trabalho de pensar em alguma). Paul Giamatti está perfeito na voz do inabalável Screw-On Head, trafegando em tons de inocência, idealismo e uma certa melancolia. Já Corey Burton fez um belo serviço dublando o Sr. Groin e o Presidente Lincoln. Veterano, ele já trabalhou na série clássica dos Transformers e do G.I. Joe, além de ser a voz cavernosa do Brainiac, em Superman: The Animated Series e Justice League Unlimited.

Mas o maior destaque é mesmo o trampo irretocável de David Hyde Pierce como Imperador Zombie. O personagem - trapaceiro, arrogante e com um senso de humor corrosivo - encontra um perfeito feedback na voz cínica de Pierce (que dublou o Abe Sapien no longa do Hellboy). O nobre zumbi lembra uma cruza bastarda de Jack Sparrow com Dr. Phibes. Um grande vilão, daqueles em que o Gary Oldman cairia como uma luva numa versão para o cinema.


O desenho é praticamente um slide-show da revista, mas algumas modificações se fazem presentes e acabam tornando as duas versões deliciosamente únicas. Alguns personagens, soluções visuais e piadas infames são diferentes. A conclusão também é diferente. Os dois são imperdíveis.

Agora é ficar de olho na programação do Sci-Fi e cruzar os dedos para que The Amazing Screw-On Head finalmente deixe sua condição de piloto multimídia.


Na trilha: PJ Harvey, Is This Desire?. Eu quero esta mulher assim mesmo.

terça-feira, 8 de agosto de 2006

The girls are back in town!




"E é eleição, é inflação, corrupção e como tem ladrão e assassino e terrorista e a guerra espacial..." Socorro. Tive de ressuscitar a seção mais relax do BZ pra dar uma desligada desse caos - ainda que por uns breves 20 ou 30 minutinhos. Já passou um bom tempo desde o último CdMTxXx (produzido pelo Fivo, por sinal!), e até que enfim vou homenagear um artista que, inicialmente, seria um dos primeiros a constar aqui, mas que por um motivo ou por outro, nunca rolou.

O ilustrador espanhol Blas Gallego é um dos raros profissionais completos nas várias expressões da sua arte. Além de desenhar muito, ele é dono de um talento ímpar na pintura tradicional (dá só uma olhada aqui e na seção "Paintings" do site oficial).

Mesmo quando aborda o concorridíssimo universo aventura/ficção, ele se destaca. Já trabalhou para a Heavy Metal, ilustrou várias capas do Conan, da série Forgotten Realms e atingiu um grande sucesso comercial com os dois volumes de seu sketch-book, Flesh & Fire.

Neste aspecto, ele não fugiu à regra e claro... teve muita influência do mestre Frank Frazetta.








Mais ilustrações aventura & sci-fi do señor Gallego aqui


Com certeza, ele é um dos maiores expoentes no gênero. Entretanto, a principal especialidade de Gallego está nas semi-charges que ele cria brilhantemente, sempre com um ótimo senso de humor e abarrotado de putaria.

Trata-se de pornochanchada espanhola clássica, como atesta essa sequência orgiástica/bacanalística através dos tempos:



Pré-História


Egito


Grécia


Roma


Idade Média


Dias atuais


Uma bela aula de História! Claro que, com toda esta pegada (capaz de arrancar um sorriso de aprovação do próprio Serpieri), o galego Gallego tratou de concentrar seus esforços em um carro-chefe mais acessível. No caso, uma pin up sensacional que ele batizou de Dolly (sem parentesco com a ovelha-clone). A magnética personagem, tão gostosa que as leis da Física impossibilitam sua existência, é a protagonista de várias situações tragicômicas envolvendo seus talentos cutâneos e abundantes.

Seguindo a escola clássica do humor físico, nos cartoons da Dolly, o señor Gallego constrói gags próximas ao estilo de alguns ilustres colaboradores da Era de Ouro da MAD - mais precisamente, os geniais Dave Berg, Don Martin e Sergio Aragonés. Enquanto eu não descolo uma almejada edição de The Very Breast of Dolly (alguém tem essa?), fique aí com a também ótima The Spanking Good Tales of Dolly.













Gallego rulz.


Na trilha: Ramones, Greatest Hits Live.